É com elevado sentido de responsabilidade e missão que assumo a presidência da Associação BRP. Estou, juntamente com a restante Direção, empenhado em ampliar a influência e o impacto das nossas propostas e iniciativas na sociedade e no país, de formar a concretizar a ambição de crescimento que reclamamos para Portugal.
Portugal perdeu na última década 653 mil portugueses em idade ativa, dos quais 194 mil licenciados – número suficiente para aumentar a percentagem da população ativa com ensino superior em 2,4pp e colocar o país acima da média da UE.
Cerca de 20 mil licenciados – equivalente a 37% do total dos 50 mil que saem das universidades e institutos politécnicos portugueses – deixam o país todos os anos.
Fuga dos 194 mil jovens licenciados representa uma perda de 1,9 mil milhões de euros por ano de investimento do Estado, e 2,3 e 4,7 mil milhões de euros de receita de IRS e Segurança Social, respetivamente.
Estudo da Associação, em colaboração com a Deloitte, conclui que o salário e poder de compra, as oportunidades e perspetivas de evolução de carreira e os regimes fiscais são os principais fatores de emigração do talento jovem.
Caminhos de solução apresentados pretendem gerar debate sobre as condições para atrair e reter o talento nacional, para combater o “inferno demográfico” que o país atravessa e penaliza o crescimento das empresas e a competitividade nacional.
Lisboa, 6 de março de 2023 – A Associação Business Roundtable Portugal (Associação BRP), organização que representa 42 das maiores empresas e grupos empresariais em Portugal, acaba de apresentar caminhos de solução dirigidos às empresas e ao Estado, com o objetivo de se criarem melhores condições para atrair e reter o talento nacional, face perda de talento qualificado e ao agravamento da evolução demográfica, que penalizam o crescimento e a escala das empresas portuguesas. Este contributo visa tornar as empresas portuguesas e o país mais competitivos face a outros mercados, sobretudo para este talento, através da melhoria de fatores como o salário, o poder de compra, a carga fiscal, os modelos de trabalho e de carreiras.
De acordo com dados do Observatório da Emigração, Portugal é o 8º país com maior taxa de emigração do mundo (5º da Europa), com cerca de 25% da população a residir fora do país. Apenas na década passada, Portugal perdeu 742 mil portugueses para a emigração, dos quais 653 mil estavam em idade ativa e 194 mil eram licenciados – representando 10,4% da população portuguesa licenciada em idade ativa, o suficiente para aumentar a percentagem da população ativa com ensino superior em 2,4pp, ficando acima da média da UE. Cerca de 20 mil licenciados – equivalente a 37% do total dos 50 mil que saem das universidades e institutos politécnicos portugueses -, deixam o país todos os anos.
Em termos de investimento do Estado, os 194 mil licenciados representam uma perda de 1,9 mil milhões de euros por ano, acrescidos da perda de receita de IRS e Segurança Social dos emigrantes em idade ativa, que se estimam em 2,3 e 4,7 mil milhões de euros – o equivalente a 60% da receita de IRS cobrada em 2021.
“Portugal está a viver um verdadeiro inferno demográfico, que tem vindo a agravar-se ao longo dos anos. Se, por um lado, temos as gerações mais qualificadas de sempre, por outro lado, mantém-se a falta de capacidade do país para atrair e reter o talento que, lá fora, consegue encontrar uma qualidade de vida bastante superior àquela que Portugal está a conseguir oferecer”, refere Vasco de Mello, Presidente da Associação BRP.
Para conhecer os fatores que influenciam a atração e retenção de talento em Portugal, a Associação BRP, em colaboração com a Deloitte, desenvolveu um inquérito de larga escala, do qual se concluiu que 24% do talento que reside no país está propenso ou muito propenso a emigrar. Destaca-se o facto desta percentagem subir para 48% no caso dos jovens da Geração Z (menos de 25 anos). Quando questionados sobre os fatores que influenciam a sua decisão, a maioria aponta o salário e o poder de compra como fatores prioritários, seguidos pelas oportunidades e perspetivas de evolução de carreira e pelos regimes fiscais.
De acordo com Nuno Amado, líder do Grupo de Trabalho Estado e membro da Direção da Associação BRP “é fundamental refletirmos enquanto sociedade que futuro queremos para os nossos jovens e para a nossa economia. Temos o salário médio abaixo da média da OCDE e um sistema fiscal que penaliza o sucesso – basta pensarmos que, em termos de salário líquido médio, um trabalhador em Espanha ganha 1,4 vezes mais que um trabalhador em Portugal, no Reino Unido 2,7 vezes mais e na Suíça 5,1 vezes mais – sem esquecer os vínculos laborais incertos, a falta de perspetivas de carreira e crescimento, e a incapacidade de aceder a uma habitação digna. Estamos, deliberadamente, a empurrar o talento mais qualificado para fora de Portugal, e por isso urge adotar soluções concretas e exequíveis.”
As perspetivas não parecem ser positivas e anteveem um agravamento da evolução demográfica. Para o talento emigrado, a ideia de um eventual regresso está cada vez mais distante, com 61% a afirmar que não pensa voltar para Portugal. Cerca de 55% dos emigrantes portugueses da última década tinham entre 20 e 39 anos, uma idade critica para constituir família, o que aumenta o risco do não regresso a Portugal. Um estudo recente confirma que 20% dos filhos de mães portuguesas nasceram fora de Portugal – valor que seria suficiente para elevar a taxa de natalidade, de 7,7%, para 8,6%, e aproximar o país dos 9,1% da média europeia.
A primeira sugestão passa pela definição de um comfortable living wage, (remuneração para um nível de vida confortável) ou seja, o nível salarial que permita a cada trabalhador obter um nível de vida confortável e ter acesso a benefícios essenciais, nomeadamente habitação, mobilidade, despesas correntes (como alimentação e saúde), lazer (por exemplo, uma viagem anual em família), entre outros elementos. Além do salário, a Associação defende que as empresas possam oferecer pacotes de benefícios em espécie, que podem ir desde a disponibilização de automóvel, até soluções mais inovadoras, como um cartão mobilidade, um subsídio de habitação ou até mesmo a disponibilização direta de casa aos trabalhadores.
Do lado do Estado, a Associação BRP propõe a agilização dos licenciamentos de construção e reabilitação de habitações, e um enquadramento legal favorável ao arrendamento, de modo a aumentar a oferta de habitação e, consequentemente, reduzir os preços.
Ao nível da carga fiscal, a proposta passa pela redução do tax wedge (hiato fiscal) – isto é, do peso do IRS e da Segurança Social no custo total de cada trabalhador – sobretudo para os níveis salariais mais baixos e com prioridade para os jovens qualificados. É proposto ainda o alargamento do pacote de complementos salariais que beneficiam de isenção de IRS e/ou Segurança Social, com destaque para as áreas da habitação e mobilidade, como forma de dar resposta à dificuldade que muitos portugueses têm em aceder a estes bens.
Já sobre os modelos de trabalho, a Associação BRP sugere às empresas: implementar uma política flexível de trabalho, incluindo o trabalho remoto, que permita acomodar as preferências dos trabalhadores às necessidades da empresa, ao mesmo tempo que possibilita aos primeiros residir em áreas geográficas com menor especulação imobiliária; estabelecer modelos de trabalho orientados para objetivos, dando maior flexibilidade horária ao trabalhadores; adotar uma estrutura organizacional menos hierarquizada, mais horizontal e ágil, que crie mais oportunidades para os trabalhadores; e possibilitar a mobilidade de funções como forma de manter o talento na empresa.
Ao Estado, a Associação BRP desafia a rever a lei laboral, no sentido de a modernizar, facilitando a emergência de novos modelos de trabalho, adequados às necessidades e expectativas de trabalhadores e empresas, e dinamizar o mercado laboral.
Por fim, sugere medidas de incentivo à progressão na carreira dos trabalhadores, a começar pela oferta de um Dual Career Path, (Modelo de Carreira Dual) que consiste num plano de progressão de carreira dentro da empresa sem que essa progressão implique responsabilidades de gestão – sendo este um modelo atrativo para talento com perfil mais técnico. As empresas devem também promover maior transparência nos planos de progressão de carreira, um acompanhamento mais individualizado de cada trabalhador (mentoring, realização de dias de trabalho com a administração), e, no caso de empresas com presença internacional, promover programas de mobilidade internacional.
“Acreditamos que os caminhos de solução que apresentamos apontam o caminho para que, a médio prazo, empresas e governo possam criar um ecossistema laboral vantajoso e competitivo que torne Portugal e as empresas portuguesas atrativos – quer para o talento interno, como para o talento estrangeiro. Precisamos de um país e de uma economia mais ousados e com maior perspetiva de crescimento. Isso faz-se garantindo que a educação de excelência que oferecemos aos nossos jovens é seguida das condições adequadas à sua fixação no nosso país", afirma Paulo Rosado, membro do Grupo de Trabalho Pessoas e da Direção da Associação BRP, e CEO da Outsystems.
Consulte aqui o paper publicado pela Associação BRP sobre a Atração e Retenção de Talento em Portugal.